Ney Matogrosso tem luta pela liberdade enfatizada na cena fluente de musical de teatro

0
33

Renan Mattos se destaca ao dar voz e corpo a Ney Matogrosso no musical ‘Homem com H’, em cartaz em São Paulo
Adriano Dória / Divulgação
Resenha de musical de teatro
Título: Ney Matogrosso – Homem com H
Texto: Marilia Toledo e Emílio Boechat
Direção: Fernanda Chamma e Marilia Toledo
Direção Musical: Daniel Rocha
Elenco: Renan Mattos (Ney Matogrosso), Adriano Tunes, Arthur Berges, Dante Paccola, Fábio Lima, Giselle Lima, Hellen de Castro, Laura Carolinah, Marcos Lanza, Maria Clara Manesco, Maurício Reducino, Natália Antunes, Rhener Freitas, Tatiana Toyota, Vitor Vieira e Yudchi Taniguti
Local: 033 Rooftop – Teatro Santander (São Paulo, SP)
Cotação: ★ ★ ★ ½
♪ A saga existencial de Ney de Souza Pereira já foi contada em livros. O mais recente e substancioso, Ney Matogrosso – A biografia (2021), escrito pelo jornalista Julio Maria, é inclusive um dos finalistas da edição de 2022 do Prêmio Jabuti.
Pautada pela luta pela liberdade nos campos musical e pessoal, a vida do artista daria um filme pela singularidade de trajetória contada com fluência na cena do musical de teatro Ney Matogrosso – Homem com H, em cartaz de sexta-feira a domingo, até 6 de novembro, no palco armado no 033 Rooftop do Teatro Santander.
Escrito por Marilia Toledo e Emílio Boechat, o texto expõe os fatos mais emblemáticos dos 81 anos de vida do cantor, com recorte que abrange os primeiros 50 anos de existência marcada por embates pela afirmação da independência.
No palco, a convincente atuação de Renan Mattos como Ney na fase adulta legitima o que é contado em cenas ágeis armadas sob a direção de Fernanda Chamma e da mesma Marília Toledo.
Traço marcante na figura de Ney, inclusive fora do palco, a expressão corporal do artista é reproduzida com perfeição pelo ator. Já a inalcançável voz de contratenor do cantor é irreproduzível nos números musicais, mas Mattos mostra entendimento do que canta quando dá voz a músicas como Mal necessário (Mauro Kwitko, 1978), a mais completa tradução de Ney, sujeito estranho, assim apresentado no título de álbum de 1980.
Ainda assim, o grande trunfo do musical Ney Matogrosso – Homem com H é a história em si, tão sedutora que até prescinde da música para fisgar o espectador. Impetuoso, Ney travou a primeira luta dentro de casa, se lançando furiosamente contra o autoritarismo do pai militar. O que levou Ney de Souza Pereira a sair de casa em 1958 e se jogar no mundo com 17 anos, sem saber que, a partir de 1973, viraria para sempre Ney Matogrosso, personagem andrógino que criou ao ser convidado para ser o vocalista do grupo Secos & Molhados.
Toda a saga artística é contada de forma cronológica, com o elenco se revezando em personagens como Luhli (1945 – 2018), João Ricardo, Regina Chaves, Rita Lee e o produtor musical Marco Mazzola, este retratado de forma extremamente afetada. Já as músicas se sucedem no roteiro servindo à ação, sem obedecer a cronologia da obra fonográfica de Ney.
Cabe destacar a alta voltagem emocional alcançada pelo canto de Poema (Roberto Frejat e Cazuza, 1998) nas cenas tocantes em que Ney aparece envolvido com um Cazuza (1958 – 1990) já debilitado pelo avanço da Aids, doença que também abreviou a vida de Marco de Maria, terceiro e último grande amor do artista (Marco é personagem importante no segundo ato do musical).
Com cenário funcional formado por rampas e praticáveis, o espetáculo resulta fiel à natureza de Ney de Souza Pereira sem perder o pique da narrativa, ainda que ceninhas inexpressivas e pretensamente engraçadas, como as da tiete que pede autógrafos dos ídolos, sejam resíduos dramatúrgicos que nada acrescentam à ação.
Se alguém desconhecer Ney (o Pereira e mesmo o Matogrosso, personagem que some quando acaba o show) e for assistir ao musical, vai saber que o cidadão sempre marcou posição na vida, mesmo que o artista nunca tenha hasteado bandeiras por entender que as atitudes, o corpo e a música vem falando por ele na saga vitoriosa pela liberdade de ser e fazer o que quiser.
Renan Mattos à frente do elenco do musical de teatro ‘Ney Matogrosso – Homem com H’, encenado em São Paulo
Adriano Dória / Divulgação

Fonte: G1 Entretenimento